Garantir condições de igualdade nos espaços de tomada de decisão para as mulheres é essencial no equilíbrio das relações de poder. Deve-se sempre citar referenciais internacionais sobre a realização de direitos e empoderamento de mulheres e meninas dos quais o Brasil é signatário, como a Plataforma de Ação de Pequim e a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável (ODS). De acordo com a perspectiva política de luta por equidade de gênero, conforme preconiza o ODS 5, as mulheres devem ter oportunidades e efetivamente participar da vida pública, em seus campos cívico e político, com condições de igualdade e equidade que lhes permitam assumir posições de liderança nos setores público e privado, com o objetivo de garantir a paridade de participação em todos os espaços.
É imprescindível ressaltar a importância da participação das mulheres nos espaços de tomada de decisão para além dos discursos, com ações concretas diante de suas instâncias e entes. É fundamental que estratégias que garantam a efetividade dessas ações possam ser planejadas e implementadas.
De acordo com o Censo Demográfico de 2022, que teve novos resultados divulgados hoje (27) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O país tem uma população residente de 203.080.756 habitantes. Deste total, 104.548.325 (51,5%) são mulheres e 98.532.431 (48,5%) são homens. De acordo com os dados do TSE nas eleições de 2020 no Brasil, foram eleitas 651 prefeitas (12,1%), contra 4.750 prefeitos (87,9%). Já para as câmaras municipais, foram 9.196 vereadoras eleitas (16%), contra 48.265 vereadores (84%). Apenas dois dos 26 estados brasileiros e do Distrito Federal eram governados por mulheres no início de 2023. Se as mulheres são a maioria da população, por qual motivo não estão presentes nos espaços de tomada de decisões de forma proporcional?
Segundo dados de participação das mulheres em cargos ministeriais em 2020 era de 8,7% e no ano de 2023 aumentou para 23,7%. Embora a ampliação tenha sido significativa, ela ainda reflete uma divergência entre a quantidade de homens que ocupam os cargos ministeriais e nos coloca numa situação de minoria nestes espaços. Quando analisamos os dados das parlamentares em exercício no Congresso Nacional em 2023, é possível perceber que a proporção de cadeiras ocupadas por mulheres em exercício na Câmara de Deputados, segundo as Unidades da Federação no Brasil, de um total de 513 cadeiras, apenas 92 (17,9%) são ocupadas por mulheres. No estado do Ceará é ainda menor, de um total de 22 cadeiras, apenas 3 (13,6%) são ocupadas por mulheres. Quais as consequências da falta de representatividade das mulheres e qual o reflexo desta lacuna nos processos decisórios?
No Brasil, em 2022, as mulheres dedicaram, aos cuidados de pessoas e/ou afazeres domésticos, quase o dobro de tempo que os homens (21,3 horas contra 11,7 horas). Na Região Nordeste esse valor aumenta, sendo que as mulheres dedicaram mais horas a essas atividades (23,5 horas), o que reflete a região com maiores desigualdades em relação aos homens. A sobrecarga das mulheres é uma variável que impacta na sua presença nas discussões e reduz significativamente sua inserção nos processos decisórios já que seu dia está com o dobro de horas, quando comparado aos homens, vinculados aos afazeres domésticos e cuidados de pessoas, o que demonstra que a divisão sexual do trabalho é desfavorável às mulheres em todos os contextos de participação, sejam através de reuniões e eventos realizados presencialmente e até no formato remoto. Diante deste contexto, em que momento são pensadas as formas de garantir e estimular a participação das mulheres pelos e nos entes do Sistema de Gerenciamento de Recursos Hídricos?
No estado do Ceará, a Política Estadual de Recursos Hídricos (Lei Nº 14.844) estabelece que a bacia hidrográfica é a base de planejamento e gestão dos recursos hídricos, tendo os Comitês de Bacia Hidrográfica - CBH como entes regionais de recursos hídricos com função consultiva e deliberativa. No estado do Ceará, atualmente existem 12 Comitês de Bacias Hidrográficas que são regulamentados por regimentos internos de criação e coordenados por uma diretoria composta por quatro integrantes distribuídos entre as funções de presidência, vice-presidência, secretaria e secretaria adjunta. De acordo com o levantamento realizado nas diretorias dos comitês do estado do Ceará durante o mês de julho de 2024, foi constatado que dos 48 integrantes, 16 eram mulheres o que equivale a 33% das diretorias, sendo que deste quantitativo, quase metade estava nos cargos de secretária adjunta e dos 12 presidentes de comitê no estado, apenas 4 são mulheres. As plenárias dos comitês de bacia, no Ceará e Brasil, estão discutindo, a participação das mulheres e a representatividade destas, nos seus colegiados e diretorias?
É um grande desafio romper o ciclo de omissão e validação de comportamentos misóginos, machistas e sexistas nos espaços de tomada de decisão. Também é importante destacar que além da participação das mulheres nos comitês de bacia, os discursos destas, devem ser propositivos e instigar a audácia, ousadia, coragem e questionamento das mulheres em suas plenárias, afinal os avanços de participação e representatividade historicamente conquistados por nós mulheres só chegaram através de luta.
Dra. Patrícia Vasconcelos Frota
Geógrafa, Professora da Universidade Estadual Vale do Acaraú
Presidenta do CBH Acaraú - CE
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