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Sumário da água

Blog da REBOB

Água: Um caso de amor.


Foto – Moinho de ventos das Salinas em Macau- Autora -Vera Ribeiro

Vera Ribeiro


Nasci em uma ilha, Ribeiro é meu sobrenome. Mesmo nascendo em uma parte de terra cercada de água por todos os lados, logo senti que quantidade de água deveria estar ligada a qualidade de água. Minha saúde era precária, sensível a qualidade da água disponível na cidade, mesmo com todos os cuidados de minha amada mãe, não era suficiente. A água era captada no rio Piranha/Açu, esse mesmo que é um rio de gestão federal, que hoje consta com um Comitê Federal entre o Estado do Rio grande do Norte e o Estado da Paraíba, o famoso Comitê de Bacia Hidrográfica do Rio Piancó-Piranhas-Açu, CBH PPA. Nos anos 60 não havia rede de distribuição de água potável, o que veio ocorrer em voltas dos anos 70, como a distribuição feita pela Companhia de Águas e Esgotos do Rio Grande do Norte-CAERN, concessionária que orgulhosamente trabalho a 40 anos.


Das escutas dos mais velhos, sempre soube que meus trisavôs maternos, os então. Derramados, como eram conhecidos, possuíam em suas terras um poço, creio ser do tipo artesiano, também conhecido como cacimbão, e vendiam água desse poço à população, em uma região chamada Porto do Roçado, hoje, Porto de São Pedro. Essas terras juntamente com o poço, posteriormente fora vendida a uma indústria salineira.

Também soube que minha outra avó materna, na época já distribuía água, vendia água, mas a domicílio. É comum no Nordeste a existência de um equipamento formado por um barril que com uma alça se permitia movimentar, atrelado a um animal de tração ou ao humano. É uma roladeira, minha bisavó vendia água, para seu sustento e dos seus dois filhos entregando água a domicilio, uma mulher das águas, uma pequena concessionária popular de distribuição de água (risos).


A passagem por minha cidade de nascença foi pequena, ficando a lembrança de uma família de tantos anos. Após, aproximadamente, duas décadas da segunda grande guerra, onde meu avô havia participado, viemos morar em Natal. A água de Macau ficou para trás.


A casa que meu avô comprar era imensa, com um quintal que me permitiu construir vários canais de navegação, com embarcações e tudo, barragens, lagos e tudo mais que minha mente de criança acreditava fazer com a água. Não havia crise hídrica e sim belos sermões de meu avô, quando via o esburacado de terra que ficava no quintal.


A casa dos meus pais era pequena, morávamos perto da escola, e sempre que podia vinha na chuva, chegando em casa toda molhada, e, tendo que enfrentar minha amada mãe que temia que eu adoecesse. Mas eu gostava da chuva, nossa casa localizava-se na parte baixa da cidade, e quando chovia ficava tudo alagado, não tinha drenagem, mas era o momento ideal para lançar novos barcos nas sarjetas da rua, com a correnteza gerada pela chuva. A porta de minha casa possuía uma janela na parte superior e sempre que chovia, subia em uma cadeira e ficava observando a chuva caindo no solo e carregando tudo que encontrava no caminho. A minha amada mãe ficava abraçada comigo também olhando a chuva, falei para ela que gostava da chuva, ela entendeu, mas me explicou que para alguns a chuva traz problemas, acho que ela também se referia as goteiras que tinha no telhado de nossa casa, que nos fazia colocar vasilhas para aparar a água das goteiras, era um transtorno. Depois disso ainda gosto da chuva, mas fico de coração partido pensando nos que estão com problemas, por causa dela. Afinal eu morava em uma região metropolitana.


Sempre sonhei ser engenheira, persegui meu sonho até conseguir, pensei construir casas, mas nos anos 80, realizei um outro sonho, entrei na Escola Técnica Federal do RN-ETFRN, hoje IFRN, e nas primeiras disciplinas do curso de Saneamento conheci a mecânica dos fluidos, foi amor ao primeiro encontro, vieram as hidráulicas, e da água, nunca mais sai delas. Ao término da ETFRN foi estagiar na concessionária de Água do Estado, a CAERN, onde continuo, conclui o curso de Engenharia Civil, e o Mestrado. Por convênio estive trabalhando na Secretaria de Recursos Hídricos do RN, onde trabalhei exclusivamente com outorgas dos direitos de usos de recursos hídricos, também estive em curto período como engenheira de saúde pública na FUNASA e retornei à CAERN.


No período que estive na SEMARH tive a oportunidade de conhecer meu Estado, conhecer o semiárido, conhecer o sertão, conhecer a dualidade da chuva, lugares que estavam alagados após o inverno, o verde espalhado no campo, substituindo as árvores cadavéricas cinzentas, com carcaças de animais assombrando e entristecendo, a quem os via a sentir que morrera uma criatura de Deus por falta de alimento, por falta de água. Vi colegas literalmente engenhando formas de fazer chegar água a lugares remotos, parabéns a todos os profissionais que exercem atividades no campo, no sol para viabilizar abastecimento de água.


No mês de junho, é mês de festas no Nordeste, quando tem chuva é fartura, é milho verde e fogueira, é alegria, é colorido é festa junina com casamento matuto, com carroças e burros enfeitados, ruas com bandeirinhas, e o sertão se torna lindo. Acredito que essa alegria é a força para o sertanejo se manter na terra com a resiliência dada por Deus. Tudo fica verde as serras a flores no campo, é tudo lindo. Já haviam me falado que o sertão era apaixonante, eu constatei isso, é lindo, tem pássaros, tem lua, tem água nos açudes, ar puro, é lindo de ver.


Percebi que diferente do lugar onde eu cresci a chuva no interior do Nordeste é bem-vinda, saber que o rio Piranhas-Açu “lavou” a ponte Felipe Guerra, entre os municípios de Assú e Itaja, no RN, enche de alegria a população, o rio é forte leva árvore e muita coisa que encontra pela frente.


Saber que a barragem verteu, sangrou, é motivo de festa na cidade, todo o ambiente muda a felicidade fica estampada nos rostos da população.


Ver, é uma extraordinária forma de conhecer, sentir, é a melhor forma de aquilatar, saber decidir é necessário sublinhar, para melhor, arriscar considerando as incertezas.


O destino me levou a fazer um mestrado na engenharia sanitária, eu já trabalhava em uma estação de tratamento de águas, mas havia sido transferida para uma estação de tratamento de esgoto, com uma grande lagoa facultativa e duas de maturação, no bairro de Ponta Negra, onde fica o belo Morro do Careca, meu tema foi lodo sobrenadante. Eu ficava horas olhando para aquela água entendendo que ela era água, não era só um esgoto, era uma água que fora suja e precisava de ajuda para tornar a ser limpa, e ser o que sempre fora, água. O sol na cidade de Natal, considerada noiva do sol, pelo grande folclorista Luís da Câmara Cascudo, é lindo, é cintilante, é gostoso, aquecia a minha pele suavizada pela brisa do mar que ficava bem próximo, a praia de Ponta Negra, um dos mais belos cartões postais da cidade, tornava a cor da lagoa bem clara, e eu desejava conhecer um meio de tornar aquela água suja, em água limpa, eu já entendia que: “ a água é uma só”.


Vera Maria Lucas Ribeiro. Formação: Msc. Engenharia Sanitária; Engenheira Civil. Engenheira da Companhia de Águas e Esgotos do Rio Grande do Norte – CAERN.

Instagram: Veraribeiro1

E-mail: Veraribeiro1@hotmail.com


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