Além da importância da participação das mulheres na gestão e conservação das águas interiores (continentais), precisamos também da participação delas nas águas oceânicas. Se nas águas doces já encontramos dificuldades para nosso protagonismo, quando tratamos do mar esses desafios aumentam.
O trabalho embarcado sempre favoreceu a presença de homens. Seja na pesca, na pesquisa científica ou no turismo, etc... mulheres têm sido afastadas dessas atividades, ora de forma sutil, ora de maneira violenta. Os assédios em local de trabalho ainda acontecem majoritariamente sobre mulheres, nos embarques essas estatísticas se reforçam.
Soma-se ainda, a essas dificuldades, outra estatística: mulheres têm ainda menos chances de chegar a posições importantes para tomada de decisão sobre a gestão e conservação marinha. Mesmo não estando na liderança, as mulheres estão à frente de muitas iniciativas pelo Oceano.
Podemos começar pela Rachel Carson, considerada a pioneira do movimento ambientalista moderno com seu livro Primavera Silenciosa. Antes de escrever sobre os impactos dos pesticidas, Carson escreveu diversos livros sobre o Oceano.
Temos a Sylvia Earle, bióloga marinha e exploradora do Oceano que até hoje, com seus atuais 85 anos, continua a desenvolver projetos para a criação de unidades de conservação marinha para proteger pedaços do Oceano. Earle ainda protagonizou uma foto que sempre me lembra como o protagonismo das mulheres pode ser apagado em momentos de destaque.
Em 2018, Earle veio ao Brasil para lançar seu livro e o Governo Federal aproveitou para decretar a criação de duas grandes unidades de conservação marinhas. No encontro com políticos, militares e representantes da sociedade civil, além Earle a outra única mulher presente na foto está quase escondida atrás dos demais homens, apesar de Angela Kuczach ser uma importante liderança pelas Unidades de Conservação.

Por aqui, temos a Marta Vannucci, pioneira da Oceanografia no Brasil, falecida no início de 2021, alguns meses antes de completar seu centenário em vida. Contribuiu muito para o estabelecimento de um dos principais institutos de pesquisa, o Instituto Oceanográfico da USP, viajou o mundo pesquisando e se tornou referência mundial sobre manguezais.
Falando sobre manguezais, temos ainda em vida a Profa. Yara Schaeffer-Novelli, também especialista no tema. Ela foi a primeira perita judicial da primeira ação civil pública movida no Brasil por dano ambiental, ainda em 1983, num rompimento de oleoduto da Petrobras na Baixada Santista. Ela é fundadora da ONG BiomaBrasil e continua ativa.
Já no quesito ONG de conservação marinha, uma das mais conhecidas no Brasil é o Projeto Tartaruga Marinha, ou Projeto TAMAR. A Neca Marcovaldi foi uma das fundadoras da ONG e atua até hoje.
Não cabe nesse post todas as mulheres que atuam pelo Oceano. Como sabemos que em quase todas as áreas as mulheres ainda encontram mais desafios para chegar em posições de liderança, precisamos constantemente lembrar que elas estão atuando e devem ser reconhecidas.
Uma iniciativa da qual faço parte é a Liga das Mulheres pelo Oceano. Esse movimento busca destacar tanto a importância da proteção do Oceano quanto a participação das mulheres nesse trabalho. Em poucos anos de existência, a Liga já tem mais de 2 mil mulheres de todas as áreas como esporte, educação, conservação, pesquisa, gestão pública, etc…Todas em busca de um Oceano mais saudável e com o reconhecimento das mulheres que atuam por ele.
A Liga das Mulheres pelo Oceano é um movimento em rede que busca potencializar ações e ideias pela proteção do oceano. Pensando nisso, dentre as iniciativas em desenvolvimento, a Liga das Mulheres pelo Oceano realizou uma campanha durante o mês de julho para mostrar as relações entre Gênero, Clima e Oceano. A campanha se chamou “Sente o Clima” e contou com diversos materiais, de posts no instagram a podcasts, incluindo figurinhas e cartazes do tipo lambe.

Durante a campanha falamos como o Oceano está presente na nossa vida, como nossa moda e alimentação se relacionam com o mar, entre outros assuntos. Contamos com contribuições de mulheres ativistas como Marina Colerato, Carla Lemos e até da apresentadora Fernanda Lima.
Mesmo que o Oceano não seja fonte direta de água potável, ele é um elemento importantíssimo para nossa regulação climática que garante nossas chuvas, cultivos e preenche nossos reservatórios. É principalmente pelo Oceano que nossas matérias primas e mercadorias são transportadas. Mais da metade do nosso oxigênio vem de organismos marinhos. Olhar com atenção para nossas águas costeiras e oceânicas é de grande importância e urgência.
Não são poucos os impactos que o Oceano vem sofrendo: sobrepesca, vazamentos de óleo, lixo plástico, poluição sonora, etc…Todos eles intensificados pela Mudanças Climáticas que estamos passando. Temos no momento a oportunidade da “Década da Ciência Oceânica para o Desenvolvimento Sustentável”, que irá até 2030, para unir esforços para melhoria da Ciência Oceânica, aumento da colaboração visando ações e projetos para um Oceano mais saudável, resiliente, produtivo e seguro.
Nesse contexto, é de grande importância um olhar ativo para as ações que são feitas pelas mulheres que atuam pelo Oceano. Pois discutir a participação das mulheres não é apenas para alcançar uma equidade numérica, mas porque as mulheres são as mais impactadas pelas mudanças climáticas e problemas ambientais. Exigir a garantia da participação das mulheres nos espaços de debate e decisão sobre os temas ambientais e climáticos é um direito que devemos buscar ativamente, e ainda ajudará a tornar as medidas mais efetivas.
Adriana Lippi
Oceanógrafa, divulgadora científica e web designer.
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